sexta-feira, 27 de maio de 2011

Observatório natural da língua falada



De tanto conhecer pessoas e amigos que confessaram sobre o hábito ou costume, sei lá, de falarem sozinhos, venho reparando várias pessoas com esse mesmo costume. De repente vejo essas pessoas andando na rua, nos bares e restaurantes, nas filas, dentro dos carros e coletivos . . . 

Tenho alguns causos interessantes:

Um deles foi o de um senhor que devia ter aproximadamente seus 55 anos e estava sentado sozinho num bar em Botafogo. Eu passava de carro e parei em frente ao bar para esperar uma pessoa, não saí de dentro do carro e também não podia ser vista por conta do insufilme. Bom, olhei pra mesa onde nosso artista estava e vi que ele já havia consumido umas 3 garrafas de cerveja de 600ml. Isso já era um bom motivo pra soltar a língua. Ele fumava e bebia, gesticulava e fazia caretas, expressões de quem está concordando com o assunto, em outros momentos se aborrecia e ficava mais enérgico nos seus gestos e falas, depois voltava a concordar, sorria, por pelo menos umas 10 vezes puxou o canto todo da boca num gesto de quem diz: “que chato isso, hein”. Eu não conseguia mais parar de olhar praquele homem, parecia que o mundo havia parado, o resto das pessoas desaparecido e só existia eu e ele. E ele não estava nem aí, passavam pessoas, a garçonete limpava a mesa dele, trazia outra cerveja e, ele parava, dava atenção à ela e depois voltava a conversar com alguém que só ele via e conhecia. Ou será conversava com ele mesmo? Sei lá . . . só sei que de repente a pessoa que eu esperava chegou e graças a Deus me trouxe de volta pro mundo das pessoas visíveis.


Outro caso foi de uma mulher, menina ainda, não devia ter nem 30 anos. Eu estava andando pelo meu percurso normal, das reuniões no centro, e logo que saí do prédio e caminhei pela Carioca, eu a vi. Toda arrumadinha, fumava e falava sem parar, carregava uma bolsa estilosa e seu papo parecia bem animado. Ela falava baixinho, mas dava pra perceber que havia uma expressão de animação em seu rosto, também fazia gestos, ria pelos cantos da boca e às vezes fazia uma cara de quem busca justificar que não é louca e que não está falando sozinha, está apenas tendo insights. Isso me faz lembrar de uma amiga que fez um curso chamado insight e parece que ainda não voltou . . .parece uma borboleta colorida voando pela Cidade e pousando nas flores, escorregando nos arco-íris, cantarolando jota Quest "Dias melhores pra sempre . . ." Bom, mas esse é assunto para outro post. Voltando a moça entusiasmada, eu caminhava lado a lado com ela numa distância razoável para que ela não percebesse a minha curiosidade em observá-la. E de rabo de olho eu ia lhe seguindo, cada gesto e palavra sussurrada. Não dava realmente pra ouvir nada do que ela falava, o barulho da cidade me impedia, mas ficou claro pra mim que ela estava num transe só dela, senti a mesma sensação que tive com o homem do bar . . . parecia que o mundo havia parado em mim e nela. Ai, que pavor! Quando eu estava para entrar no metrô, ela seguiu em frente. Confesso que me senti aliviada, libertada de uma corrente invisível que essas pessoas nos enlaçam. Parece MATRIX, saca?


Essa semana, parei meu carro num sinal ao lado de outro carro, olhei pro lado e vi o cara falando sozinho dentro do carro. Não não, ele não estava cantando e nem falando no viva voz, porque ele falava e fazia aqueles gestos habituais de quem já fala sozinho por hobby mesmo, já estou ficando craque em reconhecer esses tipos. Eu fiquei ali o tempo do sinal olhando e tentando decifrar se era animado, triste, chateado, irritado, surpreso, o assunto/tema dessa fantasmagórica conversa, mas não deu muito tempo. Só sei que ele estava tão envolvido que o sinal abriu e ele não saiu com o carro e eu muito menos, pois estava observando ele. Os carros buzinaram e fui obrigada a deixar aquele sujeito sem estabelecer a tal conexão da corrente. Garças a Deus!!!


Eu não consigo falar sozinha de jeito nenhum, nem em casa com portas e janelas fechadas, tenho a maior dificuldade, acho que é coisa do signo, sou taurina e meus pés estão cravados na terra e na realidade. Talvez por isso fico tão enfeitiçada olhando essas pessoas . . . são tão diferentes, tão mais soltas e desprendidas. . .
Não vou negar que tenho um pouco de medinho, sei lá, vai que elas estão mesmo conversando com alguém que eu não vejo?


Sendo psicóloga já fui questionada sobre o que acho dessas pessoas – Será que é esquizofrenia? Pode ser espiritual, encosto de algum espírito? Sinceramente, não sei e nem estou a fim de conceituar ou trazer essa discussão, apenas relatar que o fato dessas pessoas agirem diferente da maioria (será?), causa sempre um estranhar de curiosidade e medo.
Ah! Como disse lá no início, tenho muitas amigas que falam sozinhas, com ou sem ajuda de espelho,  elas me parecem normais, ou melhor, não esquizofrênicas, e nem possuidas por algum espírito, só quando bebem e conversam de verdade com alguém bem visível, kkkk!

Um comentário:

  1. Adoro gente que fala sozinho, eu mesma canso de bater altos papos comigo mesma, seja sozinha em casa ou no meio da na rua. Claro que seguro a onda quando estou em público.
    Adorei o texto!!!! Beijos,
    Mel

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