segunda-feira, 11 de junho de 2012

A minha alma (ainda) pouco imoral





Nunca me vi tão perplexa e boquiaberta, em êxtase melhor dizendo, como nesse fim de semana ao assistir o espetáculo: A Alma Imoral com Clarice Niskier, uma adaptação do livro de mesmo título, do rabino Nilton Bonder.

Seguiria Clarice em toda a sua turnê pelo Brasil, isso se pudesse, mas como a minha alma ainda de aprendiz não é em sua plenitude uma alma livre e imoral, preciso conduzí-la presa a um corpo ainda aprisionado pelos tantos conceitos do sistema a qual pertenço . . . e mesmo querendo sair por aí desbravando os muitos lugares que talvez não consiga conhecer por impossibilidade de rompimentos transgressores, o jeito é mesmo seguí-la no Youtube, nas vezes em que seu espetáculo estiver no Rio, ler o livro do rabino pela internet e tentar buscar uma mutação da minha ignorância que engatinha para uma possibilidade consciente (agora, embora, nunca seja tarde!) de alma imoral, sem perder a condição de ser coletivo e social. Mas de um ser humano que se sabe ser humano e que vê, e mesmo vendo , sabe que nem tudo aquilo que vê é o que é.

Abaixo vou citar algumas frases que lembro e outras que estou ainda lendo e relendo . . . 
De certo que numa tentativa de não perder-me do foco e nem de me ver absolutamente ignorante das deficiências a que estou anos submetida, faço aqui minhas próprias considerações!


''O problema, no entanto, está no fato de que é impossível mudar sem se expor ao erro absoluto."

-E assim me vi errando, ah meu humilde erro! E foi errando de um jeito tão tolo e desesperador que consegui através de uma exposição banal enxergar com os olhos de quem vê. Revelador e constrangedor sim, mas de um salto necessário para a proposta transgressora, sem perder a essência de tudo que aprendi. Desconstruir é de fato necessário, mas não deixar de existir na sua própria essência, como se morrer fosse a libertação para uma nova vida sem traços do que absorveu das experiencias passadas. Assumir, no mais amplo conceito de seu significado o erro e a tolice, já é imoral.

"A importância do presente está na responsabilidade que temos de honrar o passado e o futuro, numa medida artisticamente concebida de honrar compromissos e rompimentos."

-É com essa certeza que busco seguir numa tentativa de recriar e possibilitar um futuro de novos compromissos e rompimentos, sem jamais desacreditar que o presente pode ser uma responsabilidade menos penosa de honrar um futuro-passado. 


“O Apego ameaça e violenta a integridade de um ser humano da mesma maneira que uma traição. Somos capazes de medir a última, mas poucas vezes nos damos conta da violência que impomos à nossa alma.”

-Essa frase, me diz muito, muito do que precisava codificar pra entender que não se pode segurar pelas mãos nem pelo coração àquele que busca o desapego, nem ao outro nem a nós mesmos. Enxerguei muitas vezes como o cego que não sabe o que não vê, quando julguei à quem transgrediu ao meu lado sem me violentar, quando o que eu achava era justamente o contrário. Somos um tanto egoístas muitas vezes, por condicionar ao amor ou a contratos, relações que já se findaram pelo tempo concreto de plantio e colheita. Assim, diante do apego de um passado ou à alguém, nos violentamos por medo ou comodismo. Podemos esquecer o compromisso com o futuro por conveniência, por sermos tolos, por medo do desconhecido e violentarmo-nos a condição de viver o apego desmedido e a acomodação, ao invés de marcharmos.

"E quantos de nossos esforços e sacrifícios são, na verdade,  'oferendas' ao nada?''

- Quem já não teve a sensação de nadar no seco? Quem nunca se deu demais num projeto ou a alguém que não está preparado para receber ou nâo tem condições de reconhecer o tipo de oferenda que está recebendo? E quantas vezes não movemos montanhas para Maomés invisíveis? Quem nunca se deu demais a quem nada tinha condições de receber?

"Aqueles que se permitem transgressões da alma com certeza são vistos e recebidos pelos outros como estrangeiros. Os que mudam de emprego radicalmente, os que refazem relações amorosas, os que abandonam vícios, os que perdem medos, o que se libertam e os que rompem experimentam a solidão que só pode ser quebrada por outro que conheça essas experiências. A natureza da experiência pode ser totalmente distinta, mas eles se tornarão parceiros enquanto 'forasteiros'." - pág. 66

Começo a perceber a necessidade latente de encontrar a turma do meu real pertencimento - meus Raul's, Cazuza's, Janis . . . eu posso me dizer transgressora assim como meus ídolos, e a minha dor vai me conduzindo para uma solidão ao encontro da libertação e do reconhecimento de quem viveu experiencias semelhantes. Não vou recusar o processo da dor, porque sei que é preciso passar por ela para alcançar a paz interior e a sua purificação. Desnudo-me da carência que me aprisiona e do apego para sair do escuro e continuar a marcha. Deixe que me vejam como estrangeiro, pois o que aqui sou é mesmo um estrangeiro disposto a enfrentar todos os medos do caminho oculto, com a certeza de que solitários estrangeiros como eu cruzarão o meu caminho.

"Ainda cometeremos muitas crucificações, mas a derradeira, a que realmente está em jogo, é a nossa. Se não encontrarmos alguma forma de paz formada de tensão entre nosso corpo e nossa alma, entre nossa moral animal e nossa imoralidade, estamos ameaçados de não redimirmos nossa espécie." - pág. 118

- Que essa paz de tensão absoluta que hoje briga em desarmonia com meu corpo e minha alma, respire novamente e não me crucifique mais. 

"A vida saberá nos julgar não apenas pelas 'perversidades' que acreditamos poder evitar, mas também pelas 'tolices' que nos permitimos." - pág. 77

- Eu mudaria a palavra 'julgar' pela palavra 'perdoar', talvez porque acredito que a vida não nos possa julgar. Ela nos da condições e formas diferentes de vermos as tolices e as perversidades que praticamos, deixando para cada um de nós, o julgamento dos compromissos aos quais fomos capazes de nos fazermos.


Clique na figura para assistir um trecho da peça.

Para os que ainda não conseguiram assistir, aqui vai a dica: se comprometa com a possibilidade de assistir o espetáculo assim que ele voltar ao Rio . . . Clarice vai deixar sua alma irrequieta por 1h e 20 min, mas você poderá ter a chance de acalmá-la por muito tempo depois. Além de desfrutar da delicadeza e sutileza corporal em que a atriz conduz o espetáculo, pela música sensível e doce que te emocionará e principalmente pelo texto.  Lamentei muito não ter visto antes, mas me perdoo porque sei que talvez esse tenha sido o mais  apropriado momento para o meu entendimento.


Clarice Niskier, uma deusa, uma musa, uma grande atriz, sem roupa nenhuma no corpo, mas com todos os assessórios da alma para lhe conduzir a uma viagem além dos olhos físicos. A nudez de Clarice na peça é a verdadeira veste da alma. Parabéns e obrigada!

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